Enxergando Além do Visível: Como a OCT e a Angiografia por OCT estão Revolucionando o Diagnóstico Oftalmológico
- Alexandre Netto
- 19 de mar.
- 4 min de leitura
Atualizado: 1 de abr.

Como médicos conseguem visualizar as camadas microscópicas da retina sem realizar nenhum corte no olho?
Contextualização
A retina, essa delicada estrutura no fundo do olho, é essencial para nossa visão e pode ser afetada por diversas doenças que comprometem seriamente a qualidade de vida.
Durante décadas, os oftalmologistas enfrentaram limitações para visualizar detalhadamente essa região sem procedimentos invasivos.
A chegada da Tomografia de Coerência Óptica (OCT) na década de 1990 representou uma verdadeira revolução, permitindo pela primeira vez obter "cortes virtuais" da retina com alta definição.
Essa tecnologia, que utiliza luz em vez de sons (como no ultrassom) ou radiação (como nos raios-X), evoluiu consideravelmente nos últimos anos, especialmente com o desenvolvimento da angiografia por OCT, que permite observar os vasos sanguíneos da retina sem a necessidade de injetar contrastes.
O que é OCT e como funciona?
A Tomografia de Coerência Óptica (OCT) é uma tecnologia de imagem não invasiva que funciona de maneira semelhante ao ultrassom, mas utilizando luz em vez de ondas sonoras. Um feixe de luz infravermelho é direcionado para a retina e, ao refletir de volta, cria imagens detalhadas das diversas camadas dessa delicada estrutura.
Imagine tirar uma fatia microscópica da retina e observá-la no microscópio – é exatamente isso que a OCT permite, mas sem qualquer corte real.
A resolução é tão impressionante que consegue detectar estruturas com espessura menor que 10 micrômetros (para comparação, um fio de cabelo humano tem cerca de 70 micrômetros).
Da OCT tradicional à angiografia por OCT
Até recentemente, para visualizar os vasos sanguíneos da retina, era necessário realizar uma angiografia com fluoresceína ou indocianina verde – procedimentos que exigem a injeção de contraste na veia do paciente. Além do desconforto, esses exames podem causar reações alérgicas em alguns casos.
A grande novidade é a angiografia por OCT (também chamada de OCTA ou OCT-A). Essa tecnologia consegue identificar o movimento dos glóbulos vermelhos dentro dos vasos sanguíneos através de múltiplas varreduras rápidas da mesma área.
O resultado? Imagens tridimensionais coloridas que mostram com precisão a rede vascular da retina e da coroide (camada vascular do olho), sem necessidade de injeção de contrastes.
Avanços tecnológicos recentes
Nos últimos cinco anos, testemunhamos avanços significativos:
1. OCT de domínio espectral (SD-OCT) e swept-source (SS-OCT):
Os equipamentos mais modernos capturam imagens muito mais rapidamente (mais de 100.000 scans por segundo), reduzindo artefatos causados pelo movimento dos olhos e permitindo imagens 3D de alta resolução. O SS-OCT consegue penetrar tecidos mais profundos, revelando estruturas como a coroide que antes eram difíceis de visualizar.
2. OCT de campo amplo:
Enquanto os primeiros aparelhos captavam apenas a região central da retina (mácula), os novos equipamentos podem escanear áreas muito maiores, chegando à periferia da retina em uma única captura.
3. OCT-A com inteligência artificial:
Algoritmos avançados de IA estão sendo incorporados para melhorar a qualidade das imagens, remover artefatos e até mesmo auxiliar no diagnóstico automático de certas condições.
4. OCT intraoperatória:
Durante cirurgias delicadas da retina, cirurgiões agora podem utilizar OCT em tempo real para guiar seus procedimentos com precisão micrométrica.
Impacto clínico
Esses avanços estão transformando o manejo de diversas doenças oculares:
- Degeneração macular relacionada à idade (DMRI):
A OCT permite detectar sinais precoces de DMRI e monitorar a resposta ao tratamento com injeções intravítreas. Estudos mostram que o diagnóstico precoce pode melhorar o prognóstico visual em até 30% dos casos.
- Retinopatia diabética:
A angiografia por OCT revela áreas de não perfusão capilar (onde não há circulação sanguínea adequada) e neovascularização (formação de vasos anormais) antes mesmo que sejam visíveis no exame clínico tradicional. Um estudo recente mostrou que a OCTA pode detectar alterações microvasculares até 2 anos antes dos métodos convencionais.
- Glaucoma:
A OCT permite medir com precisão a camada de fibras nervosas da retina, essencial para o diagnóstico precoce e acompanhamento do glaucoma. A tecnologia atual consegue detectar perdas de apenas 5% das fibras nervosas, enquanto os métodos convencionais só identificam perdas acima de 30-40%.
- Doenças da mácula:
Condições como buraco macular, membrana epirretiniana e edema macular cistóide são visualizadas com detalhes impressionantes, permitindo diagnósticos mais precisos e planejamentos cirúrgicos otimizados.
Limitações e desafios
Apesar dos avanços notáveis, algumas limitações persistem:
- O alto custo dos equipamentos mais modernos ainda limita sua disponibilidade, especialmente em regiões menos desenvolvidas.
- A interpretação das imagens requer treinamento especializado, e a padronização de protocolos ainda está em desenvolvimento.
- A angiografia por OCT, embora revolucionária, ainda não substitui completamente a angiografia tradicional em todas as situações clínicas.
- Pacientes com opacidades nos meios oculares (como catarata avançada) podem ter exames de qualidade reduzida.
Conclusão e Perspectivas
A evolução da OCT e o desenvolvimento da angiografia por OCT representam um dos maiores avanços em diagnóstico oftalmológico das últimas décadas.
Essas tecnologias não invasivas estão permitindo diagnósticos mais precoces, tratamentos mais precisos e melhor compreensão de doenças que ameaçam a visão.
No futuro próximo, podemos esperar equipamentos ainda mais rápidos, com maior resolução e mais acessíveis.
A integração com inteligência artificial promete auxiliar oftalmologistas a interpretar o enorme volume de dados gerados e identificar padrões sutis de doenças. Além disso, OCTs portáteis já estão sendo desenvolvidos, o que poderá democratizar o acesso a essa tecnologia.
Para pacientes com doenças da retina, esses avanços significam maior chance de preservação da visão, tratamentos mais personalizados e menos procedimentos invasivos – traduzindo-se em melhor qualidade de vida.
Referências e Recursos Adicionais
- American Academy of Ophthalmology: [OCT and OCTA Clinical Applications](https://www.aao.org/eyenet/article/oct-angiography-clinical-applications)
- Review of Optometry: [The Evolution of OCT](https://www.reviewofoptometry.com/article/the-evolution-of-oct)
- Journal of Ophthalmology: [Advances in OCT Angiography](https://www.hindawi.com/journals/joph/)
- Instituto Nacional do Olho (NEI): [Understanding OCT Technology](https://www.nei.nih.gov/)
- Artigos relacionados em nosso blog:
- "Entendendo a Retinopatia Diabética"
- "DMRI: Fatores de Risco e Novas Terapias"
- "Como funciona o exame de fundo de olho"
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